Especialistas que atuam em reestruturação falam sobre o processo para tentar reviver empresas quase falidas
Os pedidos de recuperação judicial e falência cresceram neste início de 2023, em ambiente de juros altos e crédito mais restrito pelos bancos. A tendência vai muito além de grandes empresas, como a Americanas, e parece estar longe de mudar, segundo especialistas.
Entre janeiro e março deste ano, foram 289 pedidos de recuperação judicial, segundo a Serasa Experian. Em 2022, nesse mesmo período, foram 210 —um aumento de 37,6%.
No caso das falências, o crescimento é ainda maior. Segundo a Serasa, no primeiro trimestre deste ano, foram 255 requerimentos feitos, contra 177 em 2022, um aumento de 44%.
“Elas nos procuram já numa situação muito complicada. Nós tiramos o presidente e os diretores, assumimos a companhia, e executamos um plano que muda as estratégias enquanto ocorre a renegociação das dívidas”, diz Mustrangi.
O fundador da Excellance afirma que, a partir do momento em que assume o comando do negócio, as conversas com os credores mudam radicalmente.
“As empresas familiares são muito resistentes, é difícil lidar com elas. Então, o contrato que fecho com esses grupos é muito duro. As captações de recursos são negociadas pessoalmente comigo.”
A TCP Partners, boutique de investimentos que atua na reestruturação de empresas, atua de forma semelhante.
“Colocamos quatro ou cinco pessoas para fazer o diagnóstico, e depois é feito um plano. Assumimos a execução desse plano, com esses profissionais assumindo a presidência, a diretoria financeira, e até o marketing”, conta Ricardo Jacomassi, sócio economista da TCP Partners.
Tanto Mustrangi quanto Jacomassi afirmam que a procura pelos serviços das empresas que comandam aumentou muito no primeiro trimestre deste ano.
“Dá para dizer que mais da metade do problema de uma empresa está no acionista. Por isso nós tiramos o comando. Todas têm em comum pessoas erradas no comando”, afirma Mustrangi.
Jacomassi, da TCP, afirma que o índice de sucesso na recuperação de empresas em dificuldades é de 80%. Mas ele faz questão de ressaltar o que leva ao insucesso de 20% dos casos que atende. “O controlador quer mudar o plano proposto, e consegue. Há um apego emocional, o acionista não quer abrir mão do poder de decisão. A situação piora ainda mais.”
Outra característica comum neste tipo de serviço é atender poucos casos, por conta da complexidade dos problemas a serem resolvidos.
“Atualmente, a TCP trabalha em três casos. Um grupo hospitalar da região Norte, uma empresa do setor de plásticos, e outra de serviços de limpeza. Somadas, elas têm cerca de 25 mil colaboradores”, afirma Jacomassi.
“Tenho uma equipe pequena, e eu entro na administração. Difícil atender muitos ‘pacientes’ por vez. Já fiz esse trabalho com cerca de 15 empresas, com 100% de sucesso”, afirma Mustrangi, que trata as companhias que atende como pacientes, já que elas “já estão na cova” quando o procuram.
Para Mustrangi, o modelo de recuperação judicial no Brasil torna muito difícil a retomada efetiva das empresas.
“Não atua na causa do problema. Vende todas as partes nobres, e sobra praticamente nada. O caminho natural é a falência”, afirma.
Fonte: Folha de São Paulo